04 fevereiro 2019

RESENHA DO PRESIDENTE DA ACADEMIA PÓETICA BRASILEIRA, MHARIO LINCOLN


MINHA GRATIDÃO AO MHARIO LINCOLN PELA RESENHA DO MEU LIVRO "A PROSA GÓTICA DE ÁLVARES DE AZEVEDO EM NOITE NA TAVERNA"

O GÓTICO, NA ALMA DE ÁLVARES DE AZEVEDO
(OU) a redescoberta de Dione Rosa
Estou pasmo com esse trabalho incomum da escritora e poetisa Dione M.S. Rosa com o inédito título, “A Prosa Gótica de Álvares de Azevedo em Noite na Taverna”.
Confesso nunca ter tido a ideia (mais aprofundada) de pelo menos pensar numa prosa gótica escrita por Manoel Antônio Álvares de Azevedo, contista, dramaturgo, poeta, ensaísta brasileiro, sendo ele imenso escritor da segunda geração romântica deste país.
Aliás, que trabalho que nada. Na verdade, é a tese dela de Mestrado em Teoria Literária, defendida no púlpito maior do Centro Universitário ‘Campos Andrade’.
Assustei-me também, quando li o capítulo “Breve histórico da Recepção Crítica de ‘Noite da Taverna’”. Nesse, Dione Rosa descobre a dualidade na personalidade de Álvares de Azevedo, “ora se mostra ingênuo, puro e casto; ora macabro, grotesco e sobrenatural (...)”. Eu, apenas, o tinha como um poeta de alta sensibilidade romântica.

Ora, quem escreve romanticamente, “Respiro o vento, e vivo de perfumes/ No murmúrio das folhas de mangueira;/ Nas noites de luar aqui descanso e a lua enche de amor a minha esteira (...)”, mesmo lendo, por exemplo, “Sou o sonho de tua esperança,/ Tua febre que nunca descansa,/ O delírio que te há-de matar! (...)”, nunca imaginaria (eu) o outro lado macabro – como assim expressam esses versos – desse romântico brasileiro.
Porém, Dione M.S. Rosa, galhardamente, redescobriu esse lado (não menos sensacional) de Álvares de Azevedo, fato que me deixou impressionado, haja vista ler e confirmar as inúmeras construções literárias nesse estilo gótico, em ‘Noite na Taverna’.
Destarte, a obra incrível de Dione M.S. Rosa, indicada ao Codex de Ouro, em 2011, brilhante advogada, nascida em Ponta Grossa (PR), mas residente e domiciliada em Curitiba (PR), reacende algo que há muito se fala e se discute, mas que, até então, se escondia entre os lençóis da noite escura: a síndrome do dr. Jekyll, na velha história de terror psicológico de “O médico e o monstro”, um dos maiores clássicos marcados pelo cientificismo da época vitoriana, onde um respeitado médico escocês, dr. Jekyll, em suas pesquisas para entender os sentimentos e a violência humanas, em seus aspectos mais primitivos, descobre em si mesmo o lado ‘animal’, chamado de mr. Hyde (do verbo hide, esconder, ocultar; mr. Hyde é a “versão oculta” do bom dr. Jekyll).
‘Mutatis Mutandi’, transferindo-se esse elemento para o livro de Dione Rosa, a mim me pesou essa ideia, inicialmente, como se o romântico Álvares de Azevedo – literariamente – se transformasse em Mr.Hyde, (Noite na Taverna, 1855), por esse escrito estar cheia de ‘(...) componentes gótico-fantásticos que intensificam os aspectos sombrios e macabros do tema principal do romance’.
Como leitor de Azevedo, acredito que toda essa construção gótica azevediana, começou, ainda, na segunda parte de “Lira dos Meus Vinte Anos”, num intuito claro de mostrar um outro tipo de linguagem poética, que não a comum da época em que viveu, coincidentemente até os 20 anos.
No fundo, a proposta de dissipação do “mundo visionário e platônico”, trazida na parte II de ‘Lira’, só vai se efetivar, com profundidade e sustança em “Noite na Taverna (1855)”, a meu ver, uma elaborada ideia de dessacralização da estética romântica.
A pesquisadora Francilda Araújo Inácio (CEFET/PB), me dá subsídios para engrossar minha opinião sobre esse belo trabalho de Dione M.S. Rosa, em cuja dissertação reaviva a grandiosidade, a dualidade, a dupla personalidade literária e, sem dúvida, a culminação do reconhecimento de muitos pela obra azevediana, pois, em sua época, o pai e o irmão mais velhos eram muito mais cultuados do que o autor de “Lira dos Meus Vinte Anos”.
Portanto, ‘Noite na Taverna (1855)’ compõe o rol de suas obras que se caracterizam pela fusão de universos linguísticos e textuais distintos. Através da mistura de linguagens, pelo trabalho de citação e pela opção pelo kitsch e pelo pastiche, a obra viabiliza um questionamento das convenções clássicas, antecipando a superação de Álvares de Azevedo em relação ao Romantismo. (...)”, completa Francilda Araújo Inácio.
Sem dúvida. A escritora e mestra Dione Rosa mostra claramente isso. Posso até complementar, pois é uma obra relevante no que se refere a uma proposta estética de revisão da tradição da época, mesmo porque, há pitadas de humor no contexto, todavia, ‘um humor fino e com força analítica’, como escreveu Francilda Inácio.
A despeito de não considerar, também, o byronismo como ponto central em “Noite na Taverna (1855)”, é certo que a obra recobre outras perspectivas: um olhar que extrapola o momento histórico e estético do romantismo, através do trabalho com a linguagem em processo, trazendo à baila os exageros não apenas os byronianos, mas os do próprio romantismo, desmistificando clichês os quais ele mesmo utilizou (e como utilizou!), ao levar mais longe uma atitude de contestação, através de uma subversão estética consciente.
Enfim, ler “A Prosa Gótica de Álvares de Azevedo em ‘Noite na Taverna’”, a mim me foi puramente salutar, pois conheci algo que ainda não havia conhecido, discutido e ampliado meus conhecimentos. Além de uma obra dissertativa, é, antes de tudo, um escrutínio de momentos gloriosos da Literatura Nacional, especialmente para quem cultiva o ativismo literário autêntico, como Dione Rosa fez na obra, envolvendo todos os momentos importantes alinhavadores da estética, métrica e criação, dentro da biônica maneira azevediana de pensar e escrever.
Vale, então, reproduzir o que está assentado à última capa, cuja significativa explicação clássica sobre a obra, resume o que de melhor há nela:
“O gótico inserido numa das categorias da literatura fantástica aborda o lado mórbido e mais recôndito da alma humana, e instala a presença do não-racional, da desordem e do caos, evocando o primitivismo do inconsciente coletivo que povoa o imaginário cultural da humanidade. Esta obra explora Noite na taverna (1855), de Álvares de Azevedo, principalmente em relação aos componentes gótico-fantásticos que intensificam os aspectos sombrios e macabros do tema principal do romance, qual seja o Liebestod (associação de amor e morte), elementos que inserem a obra na segunda fase do romantismo brasileiro, o ultrarromantismo, uma corrente literária influenciada por atitudes não convencionais e pela poesia de Lord Byron. Os estudos de Howard Philips Lovecraft, Nöel Carroll, Tzvetan Todorov, Antonio Candido, Cileine Alves, Karin Volobuef e Daniel Serravalle de Sá são utilizados como apoio teórico para a análise da narrativa-moldura e dos cinco contos nela encaixados. Nessa investigação, o conceito de horror gótico, teorizado por Carroll e Lovecraft, e a noção de insólito, desenvolvida por Freud, são privilegiados. No último capítulo, o romance gráfico Noite na taverna (2011) é brevemente discutido, e o processo de transposição para os HQs, do conto intitulado Solfieri, é descrito, com o intuito de mostrar que o interesse perene dos leitores pela obra de Álvares de Azevedo contribuiu para a valorização de seu projeto estético”.
Muito feliz e enriquecido por lê-la, Dione M.S. Rosa.
Grato por isso.
Mhario Lincoln
Presidente da Academia Poética Brasileira.
Curitiba, 04/02/2019.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Para compras, contatos, parcerias, entrevistas ou outros assuntos, enviem um e-mail para: dirosa19@gmail.com ou facebook dione.soutodarosa